Clementina, cadê você?
EQUIPE TESTEMUNHA OCULAR
Clementina de Jesus nasceu em 1901, em Valença, sul do Estado do Rio. Bem jovem, envolveu-se na capital com o mundo do samba, do qual sempre manteve alguma proximidade. A imprensa não sabia quem era ela e só pôde transformá-la em notícia após sua estreia profissional, aos 63 anos. Não existem fotos de Clementina jovem, o que é uma pena. As que existem, porém, são expressivas. As feições evocam parte significativa da história do Brasil – da neta de escravizados que teve vida pobre, mas não perdeu o brilho.
Com sua voz marcante, também carregada de história, ela atraiu a atenção do poeta e produtor Hermínio Bello de Carvalho em 15 de outubro de 1963, na festa de Nossa Senhora da Glória. Depois se encontraram na inauguração do bar Zicartola, em fevereiro de 1964 – ela íntima de Zica e Cartola, a quem conhecia desde os anos 1930. Só em outubro seguinte engataram uma amizade que culminou, dois meses depois, no lançamento de uma “nova” cantora, no espetáculo “O menestrel”.
Em 18 de março de 1965, no Teatro Jovem, em Botafogo, estreou o que se tornaria o histórico “Rosa de Ouro”. Clementina era acompanhada pelos que ficaram conhecidos como Quatro Crioulos: Paulinho da Viola, Jair do Cavaquinho, Nescarzinho do Salgueiro e Elton Medeiros – o quinto, Nelson Sargento, entraria pouco depois.
Em 1968, Mauro Duarte passou a integrar o conjunto em substituição a Paulinho, já em carreira solo. Naquele mesmo ano, Clementina gravou o disco “Gente da antiga” ao lado de Pixinguinha e João da Baiana. Conhecera os dois ainda na década de 1920, na região do Centro do Rio que ficou conhecida como Pequena África. Era uma região de matriarcas egressas da Bahia, como Tia Ciata – a quem Clementina também conheceu – e Tia Perciliana, mãe de João da Baiana.
É ele, elegante com sua gravata, quem a observa autografando o LP “Clementina, cadê você?”, lançado naquele 11 de junho de 1970 no Museu da Imagem e do Som do Rio. Ao fundo está Vó Maria, segunda mulher de Donga, outro pioneiro do samba.
Clementina se tornou uma estrela, lotando teatros como o Opinião, onde foi criada em 1971 a série Noitada do Samba. Porém, embora permanecesse admirada, as dificuldades financeiras a fizeram cantar em lugares aquém de seu talento e fosse alvo de shows beneficentes.
Sua fonte maior de segurança na vida, ao menos emocional, foi Albino Corrêa Bastos da Silva, o Albino Pé Grande – calçava 43. Casaram em 1940 e só se separaram em 1977, quando ele morreu. Viveram por duas décadas na Rua Acaú, no Engenho Novo, e tiveram seu amor registrado em reportagens. Clementina viria a morrer em 19 de julho de 1987, após o quinto derrame.