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Foto Histórica

A fome há 60 anos

EQUIPE TESTEMUNHA OCULAR

“Nenhuma calamidade pode desagregar a personalidade humana tão profundamente […] quanto a fome” – escrevia Josué de Castro em 1946, no livro Geografia da fome.

Dezesseis anos depois, no dia 5 de julho de 1962, explodia no município de Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, a maior onda de saques ao comércio da história do país. E que imediatamente se alastrou pelas cidades vizinhas e entrou pela Zona Norte do Rio de Janeiro. A imprensa do dia seguinte dava conta de 42 mortos, 700 feridos e 2 mil lojas atingidas. Os saques duraram 10 dias.

A fome foi o móvel da fúria dos milhares de saqueadores. A inflação atingiu 50% ao ano em 1962 e foi acompanhada de crises de desabastecimento de alimentos. No dia 5 de julho, 20 mil trabalhadores reuniram-se na Praça do Pacificador, no centro do município de Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, no Rio de Janeiro, atendendo à convocação de uma greve geral. Entre os manifestantes correu a informação de que um supermercado das redondezas tinha recebido grande quantidade de feijão. Em pouco tempo começou o saque.

Os jornais noticiaram os saques com grande destaque. O Jornal do Brasil estampava em sua manchete do dia 6 de julho: “Explosão popular do Estado do Rio: 700 vítimas e danos de um bilhão (de cruzeiros)”. O jornal popular Luta Democrática ia além e falava em 1.500 vítimas e 10.000 estabelecimentos atingidos. Informava-se também que comerciantes contrataram milícias para enfrentar com armas a massa enfurecida, mas desarmada.

Em 1962 o país vivia uma situação de instabilidade política. Jânio Quadros renunciara à presidência da Republica em agosto de 1961, menos de sete meses depois de ter tomado posse. João Goulart, o vice-presidente, filiado ao PTB, estava em viagem à China, e os militares queriam impedir sua volta ao país por ser ele um político de esquerda. Houve resistência ao golpe, liderada por Leonel Brizola, então governador do Rio Grande do Sul. Depois de demoradas negociações, as Forças Armadas concordaram com a volta de Goulart desde que fosse adotado o parlamentarismo, enfraquecendo o poder do presidente. E assim foi.

Sessenta anos depois dos saques, a fome não acabou – ao contrário, aumentou. Os mais recentes números, divulgados agora em julho de 2022 pela rede brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Penssan), revelam que subiu para 33,1 milhões o número de brasileiros desnutridos ou que passam fome.

Multidão quebra loja em São João de Meriti, na Baixada Fluminense
Saqueadores levam mercadorias após invasões em Duque de Caxias
Loja da rede de supermercados Casas da Banha após ser invadida
A onda de saques foi causada pela fome, pela inflação alta e pelo desabastecimento de alimentos
Os saques duraram dez dias. Somente no dia seguinte ao começo do quebra-quebra, a repressão policial já havia deixado 42 mortos e 700 feridos
A fúria popular foi contida pela polícia e por milícias contratadas pelos comerciantes
O IMS envidou todos os esforços para identificar e localizar os autores das obras fotográficas publicadas neste site, e agradece toda informação suplementar a respeito.
Moradores de Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, carregam produtos saqueados das lojas, em 1962