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O absurdo da guerra

EQUIPE TESTEMUNHA OCULAR

A imagem de uma ucraniana grávida sendo retirada às pressas da maternidade bombardeada pelas forças russas é a grande vencedora da edição de 2023 do World Press Photo. A foto feita pelo ucraniano Evgeniy Maloletka, da agência americana Associated Press, mostra Iryna Kalinina, de 32 anos, moradora de Mariupol, cidade ao sul do país que havia sido invadida em 24 de fevereiro de 2022 pela Rússia.

Maloletka fazia parte da única equipe de imprensa que permaneceu na cidade após a ocupação, junto com o produtor de vídeo Mystyslav Chernov e a produtora Vasilisa Stepanenko. Os três acompanharam a vítima ao hospital para onde ela foi levada. Iryna, que estava ferida no quadril, viu seu bebê nascer morto e, cerca de meia hora depois, também não resistiu e morreu.

O jornalista disse que havia chegado a Mariupol uma hora antes da invasão. Durante 20 dias, morou com paramédicos no hospital e com pessoas comuns em abrigos, tentando mostrar o medo com que viviam os ucranianos. Ele falou sobre o episódio envolvendo a mulher grávida: “Para mim, é um momento que o tempo todo quero esquecer, mas não consigo. A história sempre ficará comigo. É importante que todas as fotos que fizemos em Mariupol se tornem evidências de um crime de guerra contra os ucranianos.” A vice-presidente da Associated Press, Julie Pace, disse que o fotógrafo “capturou uma das imagens mais marcantes da guerra Rússia-Ucrânia em meio a circunstâncias incrivelmente desafiadoras”. Ela declarou ainda: “Sem sua coragem inabalável, pouco se saberia sobre um dos ataques mais brutais da Rússia.”

Ao justificar o prêmio, o júri disse que a imagem “captura o absurdo e o horror da guerra”. “Trata-se de uma representação fiel do evento do ano e evidencia que crimes de guerra têm sido cometidos pelas forças russas contra civis ucranianos”, explicaram os jurados, acrescentando que a foto retrata algo “doloroso e mostra o assassinato de futuras gerações de ucranianos”. O júri disse esperar ainda “que o mundo reconheça a intolerável realidade da guerra e pense sobre o futuro da Ucrânia”.

As autoridades ucranianas haviam denunciando o bombardeio da maternidade, mas inicialmente a Rússica classificou a notícia como fake news. Mais tarde, admitiu o ataque, mas alegou que o hospital havia sido ocupado por paramilitares, enquanto os pacientes e os funcionários tinham sido evacuados. Mas uma investigação concluiu que foi crime de guerra.

O World Press Photo premiou mais três trabalhos. Na categoria de projeto de longo prazo, venceu Anush Babajanyan, da Armênia, com registros da forma como a população da Ásia Central se adaptou às dificuldades de acesso a água deixadas por políticas soviéticas e pela emergência climática. Já na categoria de história do ano, o vencedor foi o dinamarquês Mads Nissen, com um conjunto de nove imagens sobre o drama do Afeganistão após o retorno dos Talibãs ao poder. Uma das imagens mostra um garoto afegão de 15 anos, Khalil Ahmad, cujos pais, sem condições de comprar comida para a família, decidiram vender um de seus rins por US$ 3.500. Após a operação, ele passou a sofrer dores crônicas e não teve mais forças para jogar futebol e críquete. A falta de trabalhos e a ameaça da fome impulsionaram dramaticamente o comércio ilegal de órgãos. Por fim, em formato aberto, o egípcio Mohamed Mahdy foi premiado com um trabalho de preservação da memória de uma vila de pescadores em seu país. As fotos vencedoras podem ser vistas no site do Word Press Photo.

Ucraniana grávida é retirada às pressas após bombardeio russo à maternidade. Levada ao hospital Iryna Kalinina, de 32 anos, morreu logo após ver seu bebê nascer morto. Foto de Evgeniy Maloletka/AP