As dores do mundo
MAURO VENTURA
O fotógrafo Sérgio Moraes detém-se diante de uma foto do venezuelano Alejandro Cegarra, do “New York Times”, e diz: “Que imagem linda e assustadora.” Ela mostra um migrante caminhando sobre o trem The Beats, na tentativa de entrar ilegalmente nos Estados Unidos a partir do México.
O registro, parte da série “Os dois muros”, integra a exposição World Press Photo (WPP), que está em cartaz até dia 25 de agosto na Caixa Cultural do Rio. A partir do dia 15 de setembro, ela segue para São Paulo. São 129 fotografias, que venceram a 67ª edição do concurso anual e representam o melhor do fotojornalismo e da fotografia documental do mundo. Foram selecionadas entre 61.062 inscrições de 3.851 fotógrafos de 130 países. São 24 projetos vencedores e seis menções honrosas, num total de 33 fotógrafos de 25 países.
Há um pouco de tudo em exibição: as guerras em Gaza e na Ucrânia, migração, família, demência, meio ambiente, crise climática, agitações políticas. Pela primeira vez o Brasil tem quatro ganhadores. “Isso mostra que a qualidade do fotojornalismo brasileiro tem reconhecimento internacional”, celebra o curador e gerente da exposição, o brasileiro Raphael Dias. São eles Lalo de Almeida, Gabriela Biló e a dupla Felipe Dana e Renata Brito.
Com “Seca na Amazônia”, Lalo foi premiado na categoria Individual da América do Sul. A foto retrata a realidade de Porto Praia, lar dos povos indígenas Ticuna, Kokama e Mayoruna. Segundo os organizadores do prêmio, “a seca fez com que os moradores tivessem que caminhar quilômetros ao longo do leito seco do rio para chegar às suas casas. Esta fotografia captura a gravidade da crise ambiental global e da seca na Amazônia.”
Biló ganhou menção honrosa por “Insurreição”, que faz parte da cobertura que ela preparou para a Folha de S.Paulo e que mostra a destruição na sede dos três poderes em Brasília causada pelos golpistas do 8 de Janeiro. Segundo o WPP, essa imagem é um “testemunho contra um desafio à integridade jornalística e à liberdade”.
Já Felipe, que é da AP, e Renata foram premiados na categoria formato com o ensaio “À deriva”, em que contam a história de um barco vindo da Mauritânia, cheio de homens mortos, que foi encontrado na costa da ilha caribenha de Tobago. Eles eram migrantes africanos em busca de uma nova vida na Europa viajando por meio de uma rota atlântica cada vez mais popular – e mais traiçoeira. Felipe e Renata procuraram respostas sobre quem eram esses homens. Um deles foi identificado como Alassane Sow, do Mali.
A convite do Testemunha Ocular, Sérgio Moraes – que foi chefe de fotografia da agência Reuters no Brasil e tem uma página dedicada a seu trabalho no site – visitou a mostra e comentou sobre as fotos que mais o chamaram a atenção e que ilustram esta reportagem, como a imagem que ganhou o prêmio máximo, de Foto do Ano, de uma mulher palestina abraçando o corpo de sua sobrinha de 5 anos. Ele também destacou várias outras imagens.
Uma delas feita pela francesa Sandra Mehl (no alto da página), que acompanhou uma história sobre os primeiros refugiados climáticos dos Estados Unidos, em Nova Orleans. Outra, tirada por Adriana Loureiro Fernandez para o The New York Times, retrata uma Venezuela em crise econômica, com sanções e crise política, após a queda dos preços do Petróleo.
A foto de Lalo igualmente deixou Sérgio Moraes impressionado. “Há alguns anos, o editor global da Reuters americana falou que tínhamos que pensar numa matéria sobre a Amazônia transformada em savana. Achei um absurdo, falei ‘você não conhece a Amazônia.’ Pois Lalo mostra que esse cenário chegou, e muito mais rapidamente do que o esperado”, lamenta.