Jovem Guarda, 60 anos
EQUIPE TESTEMUNHA OCULAR
Às 16h do dia 22 de agosto de 1965 entrava no ar uma nova atração na TV Record, que iria se tornar um fenômeno de popularidade e lançaria um movimento musical que introduziu a guitarra elétrica na música brasileira. Apresentado por Roberto Carlos, Erasmo Carlos, o Tremendão, e Wanderléa, a Ternurinha, o programa “Jovem Guarda” trouxe pela primeira vez artistas jovens para falar com um público jovem. Foi um sucesso instantâneo. A atração durou apenas três anos – até junho de 1968 -, mas a Jovem Guarda resiste até hoje, 60 anos depois.
A Jovem Guarda surgiu quando Paulo Machado de Carvalho, dono da Record, pensou em criar uma atração dominical voltada para o público jovem para enfrentar a concorrência, representada pelo programa “Festival da Juventude”, líder de audiência e exibido pela Excelsior.
A ideia era lançar em setembro, mas a Record perdeu os direitos de transmissão de um jogo de futebol e teve que antecipar a novidade. O programa iria se chamar “Festa de Arromba”, nome de uma música de Erasmo, mas virou “Jovem Guarda”, por sugestão do publicitário Carlito Maia, que se inspirou em uma coluna de Ricardo Amaral no jornal “Última Hora”, que citava uma frase de Lênin, um dos líderes da Revolução Russa de 1917: “O futuro do socialismo repousa nos ombros da Jovem Guarda”.
Mas a Jovem Guarda não tinha nada de política, pelo menos não no seu sentido partidário. Era influenciada pelo rock que surgiu nos Estados Unidos e na Inglaterra e trazia músicas alegres, românticas e vibrantes. Chegou a ser acusada de alienante, numa época em que o Brasil estava sob uma ditadura militar.
Mas, como escreveu o colunista Joaquim Ferreira dos Santos em sua coluna no Globo, “é preciso comemorar tamanha aposta na alegria em meio àquela noite escura da ditadura”.
As gravações aconteciam no Teatro Record, na Rua da Consolação, em São Paulo, fundado em 9 de março de 1959. A influência foi além da música e se espalhou pela moda, pelo comportamento, pelo consumo – estampava álbuns de figurinhas, peças de vestuário (da Coleção Calhambeque), amplificadores de guitarra (Tremendão), bonecos e chicletes – e pela linguagem. Como observou à Agência Brasil o diretor do Museu da Imagem e do Som (MIS) de São Paulo, André Sturm, várias palavras e gírias de letras das músicas da Jovem Guarda viraram coloquiais na língua portuguesa como “broto”, “é brasa, mora”, “iê-iê-iê” e “papo firme”.
“Foi o primeiro movimento pop do Brasil”, escreveu no G1 o jornalista Mauro Ferreira, que disse: “Embora sem causa, a rebeldia da Jovem Guarda provocou mudanças comportamentais, alterou costumes e introduziu a guitarra – e o órgão do tecladista Lafayette Coelho – na música brasileira, mobilizando a juventude e irritando a ala nacionalista formada por nomes como Elis Regina.”

Ao jornal O Globo, o pesquisador Marcelo Fróes, autor do livro “Jovem Guarda: em ritmo de aventura”, disse que o tempo provou que a Jovem Guarda não foi só versão de música internacional. As décadas posteriores mostraram, segundo ele, a força autoral de outros nomes do movimento, para além de Roberto e Erasmo. Tanto que foram resgatados por artistas contemporâneos de sucesso, como Marisa Monte (que gravou “Negro gato”, de Getúlio Côrtes), Adriana Calcanhotto (“Devolva-me”, de Renato Barros e Lílian) e Barão Vermelho (“Vem quente que eu estou fervendo”, de Eduardo Araújo e Carlos Imperial).
Pouco mais de três anos depois de surgir, o programa deixou de ser exibido. Mas a essência que deu origem ao movimento continua, como Roberto Carlos certa vez comentou: “A Jovem Guarda não acabou só porque um programa com o seu nome saiu do ar. Isto não quer dizer que o movimento acabou. O programa Jovem Guarda cumpriu suas finalidades, e até ultrapassou a expectativa desse movimento. Jovem Guarda quer dizer renovação, porque é sinônimo de juventude, como uma corrida de revezamento, entende? Um vai passando o bastão para o outro, só que esta corrida não tem fim, porque a juventude é eterna, dinâmica, e, graças aos Céus, tem sempre fome de coisas novas.”